CAPÍTULO 15 - A PRIMEIRA DECLARAÇÃO DO FÓRUM DO MILÊNIO |
A
Primeira Versão da A ONU para o século XXI
Na aurora do novo milênio, nós, os representantes da sociedade civil mundial, vemos uma necessidade urgente de abraçar e afirmar uma visão ousada do futuro da humanidade - e depois clamar por e passar à ação para sua realização. A visão que defendemos é, em essência, bem simples. Todos nós, habitantes da Terra, somos uma família, vivendo juntos de forma interdependente num lar comum, com o mesmo objetivo de estabelecer uma civilização justa, pacífica e sustentável marcada pela democracia, igualdade e total participação para todas as pessoas, qualquer que seja seu sexo, religião, idade, raça ou nacionalidade. O que distingue essa visão é sua natureza universal e sua completa rejeição à superioridade de qualquer grupo em particular. É uma visão de inclusão global. Essa visão, cremos, já está nascendo no mundo. Ela surge de profundas forças do espírito humano e reflete a natureza da realidade. Outros indivíduos, instituições, reuniões e grupos propuseram seus elementos essenciais. Em linhas gerais, ela reflete as maiores esperanças e os mais nobres ideais das pessoas em todo lugar. Em última instância, incorpora mais do que mera aspiração - é parte de um processo inevitável e, ao, mesmo tempo, uma necessidade urgente. Nós nos reunimos na sede da ONU em Nova York no Fórum do Milênio de 22 a 26 de maio de 2000 para discutir com dar um novo ímpeto a essa visão. Somos 1400 delegados de mais de 1000 organizações em cerca de 140 nações. Através das organizações e coalizões às quais pertencemos, representamos milhões de pessoas em virtualmente todos os países do mundo. O local de realização desse fórum é importante porque, de muitas formas, essa visão de inclusão global está no coração do ideal da instituição chamada Nações Unidas. A ONU foi moldada por essa visão, e, a seu turno, ajudou a dar a esta mais coerência e expressão. Com sua participação universal, a ONU é a instituição global mais importante no mundo hoje - e sua significância apenas aumentará à medida em que reconhecermos nossa interdependência. Quando explorada em sua totalidade, essa nova visão global abrange aqueles valores, normas e princípios que, nos últimos anos, têm-se tornado mais largamente aceitos em virtualmente todo país. Entre os mais importantes desses princípios, seguem-se: Homens e mulheres têm direitos iguais em todas as esferas; a meta da justiça econômica para todos deve suplantar interesses particulares nos mercados globais; nossas atividades de desenvolvimento devem ser sustentáveis e prever as necessidades das gerações futuras ao mesmo tempo em que buscam erradicar a pobreza, todas as formas de intolerância devem ser eliminadas de nossas leis sociais escritas ou não; todas as formas de agressão devem ser substituídas por meios pacíficos para resolução de conflitos. Em nível básico, tem-se repetidamente dado voz a essa visão através de várias atividades, projetos e deliberações de organizações não-governamentais (ONGs). Realmente, ela está no coração do discurso das ONGs em nível internacional e é substância de muito do ativismo dessas mesmas organizações, especialmente nessa última década. Está entremeada em muitos dos documentos que foram discutidos e aceitos durante as grandes conferências da ONU nos anos 90.[1] Esses documentos ONG incluem Princípios de Direitos e Obrigações Gerais;[2] Os Tratados de Cúpula Alternativos das ONGs;[3] a Declaração Alternativa de Copenhague;[4] a Declaração ONG de Pequim;[5] a Declaração ONG ao Conselho dos Pares sobre Habitat II;[6] a Agenda de Hague pela Justiça e Paz para o século XXI;[7] a Minuta-Programa de Ação de Seul: uma Agenda pela Paz, Segurança e Desenvolvimento no século XXI; 8] a Montreal [i]Message: o Espírito de Montreal;[9] e a Carta da Terra.[10] Essa visão
também se reflete nos planos de ação global que foram
produzidos pelos estados membros das nações unidas
nessas mesmas conferências. Isso dificilmente surpreende, tendo em vista que as ONGs desempenharam um papel fundamental levando às conferências as vozes dos povos do mundo e ajudando a esboçar porções significativas dos planos de ação resultantes. Esses planos[11] delineiam passos concretos - políticas, ações e processos - para realização da justiça econômica e social nas nações do mundo. Além disso, diversos estudos da ONU, incluindo os da Organização Educacional, Científica e Cultural das Nações Unidas (UNESCO),[12] do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (UNDP)[13] e do Instituto de Pesquisas para o Desenvolvimento Social das Nações Unidas (UNRISD)[14] afirmam muitos aspectos dessa visão e sugerem medidas práticas para realizá-la. Adicionalmente, uma diversidade de estudos acadêmicos e outras propostas visando influenciar a ONU oferecem recomendações práticas e ao mesmo tempo visionárias para que se atinja a paz, a justiça e a democracia global.[15] Entretanto, apesar desse consenso crescente, ainda falta muito comprometimento e ação para que se atinja essa visão. As estatísticas variam levemente de ano em ano e relato em relato mas são, ainda assim, sempre chocantes ao nosso senso de humanidade. Cerca de 840 milhões de pessoas são mal alimentadas, 1,3 bilhão não têm acesso a água limpa, e uma em cada sete crianças em idade escolar está fora da escola.[16] Cerca de 1,5 bilhão de pessoas subsistem com menos de um Dólar por dia[17] e de 2,8 bilhão, com menos de dois Dólares[18]. E na avaliação mais recente, havia aproximadamente 35 conflitos armados no mundo[19], conflitos largamente baseados em motivos de etnia religião ou raça. Colocando de forma simples, se essa visão deve ser obtida, o mundo precisa agora é de atos, e não palavras, ações, e não promessas. É para esse fim que o Fórum do Milênio busca fazer as seguintes questões: Como se pode realizar essa Grande Visão? Quais são as barreiras para sua total implementação? Quais são as ações concretas que podem ser tomadas nesse sentido? A Promessa da História Sob certos aspectos, essa visão não é nova. Ao contrário, pode-se dizer que a humanidade ao longo dos séculos XIX e XX a completou em seus detalhes e estabeleceu a base tecnológica e científica para torná-la finalmente possível. Essa visão foi expressa ao longo da história, em termos proféticos, como uma idade dourada de harmonia e prosperidade, uma era de justiça e paz para toda humanidade. Está guardada, freqüentemente em linguagem simbólica, nos ensinamentos das religiões mundiais, desde trechos bíblicos até o Corão, incluindo-se profecias de Zoroastro e a visão Sikh [20, 21, 22, 23, 24]. Deve-se notar, ainda, que as atividades inter-religiosas têm-se expandido exponencialmente em todos os níveis nos últimos anos, [25] e que muitas dessas atividades têm gerado uma visão comum do futuro da humanidade, uma visão baseada em ensinamentos religiosos de esperança, compaixão, amor, paz, justiça e unidade. [26] Aspectos dessa visão também podem ser encontrados nos grandes movimentos sociais modernos - movimentos comumente originados ou que só adquiriram força e legitimidade na sociedade civil. O trabalho de líderes que vão desde Susan B. Anthony e Mahatma Gandhi até Martin Luther King jr., Madre Teresa e Nelson Mandela avançou essa visão. O impulso em direção à paz e à justiça pode ser identificado em vários movimentos, desde a abolição da escravatura e o sufrágio feminino até a luta contra o colonialismo, as grandes campanhas por harmonia racial e justiça econômica, e os incessantes esforços pela paz mundial. Conforme visto, essa visão tem também crescido nos grandes, fundamentais documentos da ONU. A ONU nasceu, com muita assistência da sociedade civil, da conflagração global que foi a Segunda Guerra Mundial. Não apenas experts provindos da sociedade civil influenciaram significantemente a criação da Carta das Nações Unidas ajudando a expressar a visão de uma nova organização que pudesse evitar catástrofes semelhantes no futuro, como, igualmente importante, a sociedade civil desempenhou um papel crucial na promoção da aceitação dessa nova organização em muitas nações, ajudando a torná-la conhecida pela população em geral e por aqueles em posição de influência, assegurando assim sua aceitação geral nessas nações. Efetivamente, muitas das novas idéias, reformas, e iniciativas arrojadas que vemos ocorrer no palco do mundo têm suas origens na sociedade civil. Crescentemente, esta tem ajudado a determinar a agenda dos assuntos internacionais e trás incansavelmente ao conhecimento público as iniciativas do momento e ajudando a obter aceitação e comprometimento às ações que moverão a comunidade mundial adiante. Ao mesmo tempo, isso dificilmente seria surpreendente. Afinal, numa época em que políticas e programas governamentais requerem suporte das pessoas que serão afetadas por eles; em que nem decreto nem medo são meios viáveis e duráveis de governo; em que legitimidade e sustentabilidade de iniciativas de desenvolvimento necessita do envolvimento do povo em sua conceituação, design, implementação e avaliação - ou seja, numa época em que a democracia é o sine qua non de nossas vidas coletivas - como poder-se-ia esperar qualquer coisa a menos do que o envolvimento ativo da sociedade civil em todos aspectos da vida organizada? Nós não procuramos, com o Fórum do Milênio, reinventar ou recriar o significativo trabalho que foi feito nos últimos anos por governos e sociedade civil na busca por estabelecer paz, justiça e unidade no mundo. Ao contrário, nossa meta aqui foi a de articular essa visão de inclusão global e então oferecer sugestões concretas sobre como governos, a ONU e os povos do mundo podem avançar neste momento da história para concretizá-lo. Três tendências dominantes Quando examinamos os esforços nos últimos anos para articular essa visão de inclusão, descobrimos que esta se caracteriza, em grande parte, por três tendências dominantes: 1)a ascensão da democracia, 2)a expansão do conhecimento humano, e 3)o reconhecimento da interdependência fundamental da humanidade. Pela ascensão da democracia, referimo-nos à completa mudança social, política e cultural que tem cada vez mais transferido o poder de poucos para muitos. É uma tendência que pode ser rememorada por pedras fundamentais históricas como o Apelo do Camponês Eloqüente no Egito dos faraós, a Magna Carta da Inglaterra Medieval, a Grande Lei da Paz, da federação Iroquois, a Declaração da Independência Americana, e a francesa Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Sua força e elasticidade são aparentes quando comparadas aos experimentos ideológicos do fascismo e do totalitarismo que escureceram o horizonte do século XX. A ascensão da democracia que tem-se acelerado claramente nos últimos anos pode ser constatada de várias maneiras: no fim de várias formas de governo autoritário; a preferência crescente dos estados por estabelecer governos através de eleições livres; a ascensão dos movimentos dos povos e da sociedade civil ao redor do mundo; o comprometimento de governos em envolver o povo na formulação de políticas; e a ênfase crescente na transparência, confiabilidade e abertura na tomada de decisões por parte do governo. Pode ser vista também na proliferação da mídia de massa, inclusive a Internet, que permite um acesso e compartilhamento de informação sem precedentes - ambos componentes essenciais da democracia. Também se manifesta no respeito e proteção crescentes dos direitos humanos para todos. Por expansão do conhecimento humano, referimo-nos a toda a gama de avanços científicos, tecnológicos e educacionais que têm acelerado o ritmo de transformação da sociedade. Essa expansão tem estimulado, também, a primeira tendência - democracia - pela disponibilização do conhecimento de outras culturas, ideologias, pensamentos, atividades e abordagens, dando ao povo acesso a uma vasta quantidade de informação. Essa expansão do conhecimento, associada à sua transmissão por vários meios, seja através da mídia de massa, do ativismo social, da educação, ou, mais recentemente, da Internet, é, entretanto, uma faca de dois gumes. Por um lado, promete aos povos do mundo uma maior parte do controle sobre seu próprio destino e novos meios para sua prosperidade coletiva. Por outro, essa expansão pode ser usada amoralmente para criar novas armas, reforçar a opressão e promover o declínio moral. Pelo reconhecimento de nossa interdependência fundamental, referimo-nos à mudança de paradigma em nosso pensamento que está surgindo com o entendimento crescente de que nossas vidas estão inextricavelmente conectadas como membros de uma única raça humana, dividindo um planeta com recursos naturais limitados. Essa compreensão recebeu muitos nomes - a aldeia global, a nave Terra, cidadania mundial, consciência planetária e outros. Ela está, efetivamente, no coração das mudanças profundas que estão ocorrendo na vida ordenada da humanidade. Essas três tendências estão interligadas e se propelem umas as outras. Por exemplo, a expansão do conhecimento levou à criação de sistemas globais de transporte e comunicação que gradualmente encolheram a Terra a uma aldeia global permitiu que os ideais democráticos se espalhassem, o que ajudou a promover sistemas sociais através dos quais o conhecimento pode ser melhor criado e partilhado, e assim por diante. Entender essas tendências - realidades fundamentais de nossa era - é indispensável à medida em que progredimos na identificação de passos concretos para ação da ONU e de todos seus parceiros. É esse entendimento que dá o conceito essencial dentro do qual os líderes do mundo - a quem esse documento é inicialmente dirigido - podem se adaptar às mudanças que estão ocorrendo e trazem uma necessidade urgente de ação. Seis Subtemas Na busca de identificar aquelas áreas em que se precisa mais de ação, o Fórum do Milênio dividiu sua consideração do tema principal, As Nações Unidas para o Século XXI em seis subtemas: 1) paz, segurança e desarmamento; 2) a erradicação da pobreza (incluindo o cancelamento de dívidas e o desenvolvimento social); 3) direitos humanos; 4) desenvolvimento social e o ambiente; 5) os desafios da globalização - o alcance da igualdade, justiça e diversidade; e 6) fortalecimento das Nações Unidas e outras organizações internacionais. De uma forma ou outra, cada um desses subtemas foi discutido e analisado pelas Nações Unidas - e pela comunidade mundial de organizações não-governamentais e sociedade civil - em suas maiores conferências da última década. Algumas discussões abordaram esses subtemas mais explicitamente do que outras. Pobreza e harmonia social foram os maiores focos - e a globalização foi um tema básico - da Conferência de Cúpula Mundial pelo desenvolvimento Social, de 1995; o desenvolvimento sustentável foi o tema principal da Conferência de Cúpula da Terra de 1992; e a Conferência Mundial dos Direitos Humanos de 1993 visou os direitos humanos. A Conferência Internacional da População e do Desenvolvimento de 1994 e a Quarta Conferência da Mulher de 1995 enfatizou temas como igualdade entre homens e mulheres, família, direitos humanos e pobreza. Como tópico isolado, o subtema da paz, segurança e desarmamento não foi o foco de uma conferência global importante da ONU na última década. Entretanto, a própria sociedade civil assumiu o desafio no Apelo de Hague pela Paz de 1999. De forma semelhante, a globalização, por si mesma, não foi enfocada separadamente; suas manifestações e efeitos, entretanto, foram discutidos até um certo ponto em todas as conferências, especialmente na Conferência Mundial de Cúpula pelo Desenvolvimento Social de 1995, a Conferência do Habitat II e a Conferência Mundial de Cúpula da Comida, ambas de 1996. E, é claro, o tópico da restruturação da ONU tem sido um dos maiores pontos de discussão dentro e em torno das Nações Unidas, especialmente desde a celebração do qüinquagésimo aniversário da Carta das Nações Unidas em 1995. Ao abordar esses subtemas, o Fórum do Milênio procurou resumir as posições da sociedade civil e apresentar aos líderes mundiais reunidos na Conferência de Cúpula do Milênio a importância de ações concretas em cada área temática. Paz, Segurança e Desarmamento O século XX foi o mais sangrento e devastado pela guerra em toda história. Foi também aquele em que se obteve dramático progresso rumo ao estabelecimento de uma paz universal e duradoura. Há cem anos atrás, era largamente aceito que guerra é apenas uma continuação da política de estado através de outros meios.[27] Hoje, graças em grande parte pelo trabalho em curso e pelas campanhas da sociedade civil e das atividades da ONU e dos governos, a guerra não é mais o meio aceitável pelo qual estados e governos resolvem suas divergências de opinião. A fundação da Liga das Nações e sua sucessora, as Nações Unidas, foram as mais importantes ações globais em favor da paz neste século. O Fórum do Milênio da pleno apoio à ONU. Nós desejamos chamar particular atenção à importância de fortalecer e democratizar a ONU, o que será abordado como um subtema a seguir. Acreditamos que uma ONU forte e democrática, capaz de levar a cabo uma ação coletiva pela paz, continua a ser o mais forte baluarte contra a guerra e o instrumento mais apropriado à promoção do desenvolvimento social e econômico das nações do mundo. Além da necessidade de fortalecer a ONU, ainda resta muito a fazer. Conforme se viu, cerca de 35 guerras continuam a se desenrolar no mundo, a maior parte sob a forma de conflitos internos. E ainda há a ameaça de conflitos internacionais em várias regiões do globo. A comunidade mundial deve intensificar seus esforços para desenvolver a democracia em todas as nações - e em todos os níveis, pois as maiores ameaças à paz e estabilidade do mundo hoje não provêm, em sua maior parte, dos estados fortes e democráticos, mas sim daqueles que são fracos e nos quais guerra civil e conflitos internos são lugar comum. Nós
instamos com os líderes do mundo reunidos na
Conferência de Cúpula do Milênio e na Assembléia do
Milênio para que estudem a Agenda de Hague pela Paz e a
Justiça no Século XXI. Ela foi forjada ao longo de dois
anos de consulta global a centenas de ONGs. Foi então
aceita por mais de 10.000 indivíduos e representantes de
ONGs reunidas no Apelo de Hague pela Paz em maio de 1999.
Ela permanece como a declaração ONG mais significativa,
ampla e aceita em questões sobre guerra e paz produzida
até hoje. É especialmente significativa devidos aos
passos detalhados para ação propostos a governos,
organizações e indivíduos para que contribuam nos
processos para a paz. Dentre os mais salientes
princípios e recomendações propostos na Agenda de
Hague e no artigo do Fórum do Milênio produzido por
nosso grupo de trabalho em Paz, Segurança e
Desarmamento estão os seguintes:
A Erradicação da Pobreza Até há talvez um século atrás, a pobreza foi largamente aceita como a sina da grande maioria da humanidade. Enquanto as maiores religiões do mundo pregavam a preocupação para com os pobres, de modo geral, pouco foi feito pelos governos para aliviar a pobreza - nem houve qualquer expectativa de que esse seria um papel dos governos. Gradualmente, ao longo do século XX, nosso senso crescente de solidariedade como uma única família humana e a correspondente compaixão pelo indivíduo levou a esforços crescentes para atacar a pobreza, um processo que se acelerou com os grandes programas de desenvolvimento iniciados após a segunda guerra mundial, incluindo aqueles da ONU e suas agências. Mais recentemente, a Conferência de Cúpula Mundial pelo Desenvolvimento Social se destaca como o ponto focal do ataque à pobreza. Mais de 115 cabeças de estado se reuniram para ratificar uma Declaração e Plano de Ação que endosse um novo assalto centrado nas pessoas aos problemas sociais, pressionando a necessidade de fortalecer as mulheres e os grupos marginalizados e pedindo aos países industrializados que se devotem mais aos mais necessitados, tanto em casa como fora dela. Talvez mais significativamente, a Conferência chegou a um consenso no objetivo de erradicar a pobreza no mundo... como um imperativo ético, social, político e econômico da humanidade.[28] Negociado em um processo de dois anos envolvendo mais de 180 países e a participação de milhares de ONGs, os documentos finais da Conferência também estabeleceram que os direitos humanos, democracia e liberdade - que são essencialmente valores espirituais e morais - são a fundação do desenvolvimento social e econômico. Nessa idéia há uma abordagem dinâmica, holística para o alívio da pobreza. Ao mesmo tempo, em cinco anos desde a Conferência Social, os governos do mundo, em sua maioria, nem levaram adiante seus compromissos para eliminar a pobreza nem atingiram as metas que estabeleceram na Conferência. A sociedade civil de todo o mundo tem uma longa história de ação em favor dos pobres. Grupos civis e organizações não-governamentais como aquelas reunidas no Fórum do Milênio tem sempre estado à frente do ataque à pobreza. Ao
considerar as várias declarações submetidas ao Fórum
do Milênio por seus parceiros na sociedade civil,
incluindo o artigo produzido pelo grupo de trabalho do
Fórum A Erradicação da Pobreza, Incluindo o
Cancelamento de Dívidas e o Desenvolvimento
Social, e documentos como a Declaração
Alternativa de Copenhague, o Fórum pretende reforçar os
seguintes princípios e entendimentos:
Direitos Humanos Direitos humanos são aqueles princípios e normas universalmente aceitos que devem governar os atos de indivíduos, comunidades e instituições para que a dignidade humana seja preservada e a justiça, o progresso e a paz sejam promovidas. São, nas palavras da Declaração Universal dos Direitos Humanos, um padrão comum de realização para todos os povos e nações. A Declaração, adotada pela Assembléia Geral da ONU em 1948, junto com o Tratado Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Tratado Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, forma o que comumente se chama a Declaração Internacional dos Direitos Humanos. Através desses acordos e outros subseqüentes (como tratados, convenções, declarações, códigos de conduta e planos de ação global adotados nas conferências da ONU), um corpo significativo de padrões e leis sobre direitos humanos foi formado ao longo das cinco últimas décadas, lidando com questões diversas como desenvolvimento, paz, casamento, a administração da justiça, direitos das mulheres e crianças, escravidão, tortura, emprego, e liberdade de expressão e credo religioso. A Declaração Universal dos Direitos Humanos e muitos dos tratados posteriores sobre o assunto foram traçados com grande participação da sociedade civil. Além disso, entre os maiores defensores do regime internacional dos direitos humanos têm estado membros dessa sociedade que, entre outras atividades, ajudam a controlar e a chamar atenção para violações desses direitos, trabalham em âmbito nacional pela ratificação de vários tratados sobre direitos humanos e pelo estabelecimento de um mecanismo nacional de sua implementação, e estão ativamente engajados na educação dos direitos humanos e da consciência pública pelo mundo afora. Os impactos dessas leis e padrões de direitos humanos na comunidade mundial foram grandes. Ainda assim, resta muito a ser feito até que todos possam gozar da proteção, liberdade e segurança que eles prometem e que as pessoas se tornem dispostas a assumir as reponsabilidades que eles implicam. Em particular, o Fórum do Milênio chama atenção para a contínua violação desses direitos nas áreas do mundo onde imperam os conflitos armados e as guerras civis; os espasmos contínuos de fanatismo étnico e religioso que afligem todo o mundo; a violação de mulheres em tempos de guerra e de paz; e a persistência da pobreza, que é um abuso da dignidade e dos direitos humanos. O Fórum do Milênio reitera a chamada todos os direitos humanos para todos e reafirma a posição tomada na Conferência Mundial dos Direitos Humanos e os encontros subseqüentes dos anos 90, de que os direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados ; de que os direitos da mulher são direitos humanos; de que devem ser feitos esforços especialmente para o reconhecimento e defesa dos direitos das crianças, povos indígenas, minorias, idosos, deficientes, refugiados e pessoas internamente excluídas; e que justiça requer a compreensão dos direitos econômicos, sociais e culturais, incluindo o direito ao desenvolvimento, para todos. Insistimos
com os líderes mundiais para que estudem cuidadosamente
o artigo sobre Direitos Humanos que foi
preparado pelo grupo de trabalho nesse subtema do Fórum
do Milênio. O que se segue são alguns dos principais
princípios e recomendações que este e outros
documentos elaborados por ONGs propõem.
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável Ao longo da primeira metade deste século, a compreensão de nossa interconexão com o ambiente natural da Terra surgiu apenas gradualmente, embora tenha havido grupos e movimentos iniciais nos anos 20 e 30, e muitas culturas tenham mantido um profundo entendimento dessa conexão. Com a publicação de Silent Spring, de Rachel Carson, nos anos 60, os efeitos do rápido desenvolvimento da sociedade humana e seu impacto no ambiente tornaram-se cada vez mais aparentes. Em resposta, a sociedade civil assumiu um papel de liderança na chamada de atenção para a necessidade de proteger o ambiente. A Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano mostrou-se um ponto de reunião para ONGs ambientais e deu origem a um crescimento significativo no número de tais organizações. Mas foi vinte anos depois, durante a Conferência de Cúpula da Terra, que ocorreu uma explosão no número e nas atividades de ONGs visando o ambiente e desenvolvimento. Efetivamente, a reunião de cerca de 20.000 representantes da sociedade civil no Fórum Global durante a Conferência de 1992 se mostrou um divisor de águas no desenvolvimento de uma sociedade civil global em termos de uma rede vastamente aumentada e uma influência grandemente aumentada na agenda internacional. As ONGs tiveram um impacto significativo na Agenda 21, que foi produzida na Conferência da Terra, e a sociedade civil continua a desempenhar um papel crucial no controle e implementação da Agenda 21 no mundo todo. O Secretário Geral da Conferência da Terra estabeleceu como um dos seis objetivos da conferência produzir uma Carta da Terra, ou seja, uma Carta que estabeleceria os princípios para governar as relações dos povos e nações entre si e com a Terra. Os governos do mundo foram incapazes de concordar com os termos dessa Carta e abandonaram a idéia, concordando em seu lugar na menos visionária, menos ambiciosa Declaração do Rio sobre o Ambiente e o Desenvolvimento. A sociedade civil aceitou o desafio e, através de um processo global, que durou oito anos, envolvendo a participação de milhares de indivíduos e organizações em todo planeta, produziu a Carta que os governos do mundo foram incapazes de criar 8 anos antes na Conferência da Terra. Completada em março de 2000, a Carta da Terra é talvez o documento mais extensiva e intensivamente estudado jamais produzido pela sociedade civil, refletindo um esforço global para tocar nos principais valores, aspirações e esperanças dos povos do mundo de dar forma a um futuro sustentável. O preâmbulo à carta é especialmente significativo devido a seu reconhecimento de nossa interdependência fundamental. Estamos num momento crítico da história da Terra, um tempo em que a humanidade deve escolher seu futuro, ele diz. À medida em que o mundo se torna cada vez mais interdependente e frágil, o futuro guarda grande perigo e grande promessa. Para avançar nós devemos reconhecer que em meio a uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida nós somos uma família humana e uma comunidade da Terra com um destino comum. Devemos nos unir para criar uma sociedade global sustentável fundada no respeito pela natureza, direitos humanos universais, justiça econômica, e uma cultura pela paz. Para esse fim, é imperativo que nós, povos do mundo, declaremos nossa responsabilidade um para com o outro, para com a maior comunidade da vida, e para com as gerações futuras. Insistimos
com os líderes mundiais para que leiam cuidadosamente a
Carta da Terra. Ao mesmo tempo, desejamos apresentar aqui
algumas idéias-chave e princípios deste e de outros
documentos recentes da sociedade civil, incluindo o
artigo produzido pelo grupo de trabalho
Desenvolvimento Sustentável e o Ambiente, do
Fórum do Milênio.
Os Desafios da Globalização Os desafios impostos pela globalização, como o ambiente, não foram largamente considerados como questões importantes na cena mundial recentemente. Olhando para trás, entretanto, é claro que o processo de globalização tem sido uma força crescente pela mudança e transformação da sociedade humana por mais de um século. Em seu senso mais amplo, a globalização pode ser vista iniciando com o barco a vapor, as estradas de ferro, e o telégrafo sem fio, e acelerando rapidamente com o advento do avião, da televisão e da Internet, e de todas as outras tecnologias que encolheram o mundo à condição de uma aldeia global. A comunidade internacional ainda tem de definir precisamente o termo globalização, apesar de alguns o definirem apenas em termos econômicos.[32] No entanto, chegou-se a um consenso quanto a várias de suas características, como se pode ver, por exemplo, em numerosas passagens dos planos de ação global das recentes conferências da ONU, incluindo as seguintes provenientes da Declaração de Copenhague sobre o Desenvolvimento Social da Conferência de Cúpula pelo Desenvolvimento Social (#14): A globalização, que é uma conseqüência da mobilidade humana aumentada, das comunicações melhoradas, fluxos de capital e comércio grandemente intensificados, e desenvolvimentos tecnológicos, abre novas oportunidades para o crescimento sustentado da economia mundial, particularmente no desenvolvimento de países. Permite também que os países compartilhem experiências e aprendam uns dos outros conquistas e dificuldades, e promove uma fertilização cruzada de ideais, valores culturais e aspirações. Ao mesmo tempo, os rápidos processos de mudança e ajuste têm sido acompanhados de pobreza, desemprego e desintegração social intensificadas. As ameaças ao bem-estar humano, como os riscos ao ambiente, também foram globalizados. Ademais, as transformações globais da economia mundial estão modificando profundamente o parâmetro da transformação social em todos os países. Como em qualquer processo de mudança, há efeitos negativos, e aceleração nos últimos anos dos processos de globalização deram origem a uma ampla rede dessas conseqüências negativas, afetando especialmente os mais vulneráveis de nossas sociedades. Esses reveses incluem o acúmulo de riquezas enormes por uma pequena minoria enquanto mais pessoas caem na pobreza do que em qualquer outra época da história; a difusão da AIDS e outras pandemias globais; a proliferação do comércio de armas; a formação de sindicatos globais do crime organizado; a globalização do tráfico e a escravidão sexual; a rede mundial de distribuição ilícita de drogas; a difusão transnacional dos problemas ambientais; deslocamentos econômicos (pobreza e desemprego crescentes) causados por vários fatores econômicos, da especulação financeira e o repagamento de dívidas ao desbalanço das normas do comércio global; a crise global dos refugiados, abastecida especialmente pela guerra e a degradação ambiental; a perda de controle dos processos da comunidade; e uma sensação de impotência em face das forças globais. Ao mesmo tempo, a globalização trás muitos efeitos positivos, modificadores da civilização que não podem ser ignorados. Entre esses benefícios estão a codificação e a promulgação de um padrão comum de direitos humanos para toda a família humana; um regime emergente de leis internacionais cobrindo a maior parte das áreas do empenho humano, da proteção ao ambiente e às espécies e uso dos bens comuns globais, aos direitos humanos e o comércio; concordância nos princípios e políticas básicas para o estabelecimento da justiça econômica e social nas nações do mundo, como previsto nos planos de ação global das maiores conferências da ONU nos anos 90; a promulgação e progressivamente difundida aceitação dos princípios de igualdade e parceria entre homens e mulheres; o estabelecimento de padrões internacionais de pesos e medidas não só em áreas comerciais como aviação, navegação e bancos, como também em áreas científicas como meteorologia, geografia e mecânica; a marcha irresistível da democracia ao redor do planeta (está criando raízes não apenas em nível nacional, mas, crescentemente, em nível local também); a expansão sem precedentes do conhecimento humano e a igualmente sem paralelo partilha de idéias, experiências, aspirações, conhecimento e intuições entre os povos do mundo; maior comunicação, interação e partilha cultural, e o correspondente crescimento do entendimento, tolerância e apreço aos outros, incluindo religiões, raças, grupos étnicos, classes e nações; o crescente senso de cidadania mundial; a explosão da cooperação tecnológica, científica e médica através das fronteiras; e o aumento dramático do número e da influência das organizações da sociedade civil. Claramente, portanto, há aspectos tanto negativos como positivos desse fenômeno. Dessa forma, é essencial fazer os processos da globalização trabalharem em benefício de toda a humanidade - criar aquilo que alguns chamam de globalização cooperativa ou inclusiva - e não apenas para os privilegiados e poderosos. Atingir essa meta requer uma regulação justa e eqüitativa de seus processos, incluindo controles legais apropriados e supervisão institucional. Podemos caracterizar os últimos séculos como sendo a era dos estados nacionais. A economia mundial era feita de economias nacionais separadas, e a maioria das grandes companhias trabalhava dentro de um único país. Mas, hoje, companhias e mercados financeiros podem cada vez mais tomar decisões de produção, marketing e investimentos relativamente livres de restrições nacionais. O poder pode ser transferido dos estados individuais para os mercados e especialmente para as corporações transnacionais. Assim, a globalização econômica revelou um descompasso entre os sistemas e instituições correntes, que são nacionais ou internacionais, e a natureza global das atividades econômicas. Em resumo, nossas instituições do pós-guerra como a ONU e a Bretton Woods foram criadas para um mundo internacional, mas nós agora vivemos num mundo global. Em outras palavras, a globalização política está progredindo muito devagar, e sofremos a falta de uma governança global adequada. Isso impõe o maior desafio para a governança global do século XXI. Países e pessoas pobres têm pouca influência na política internacional de hoje. Na organização Mundial de Comércio, cerca de 30 países não podem pagar para manter escritórios permanentes em Genebra, e estão portanto excluídos da formulação de acordos de comércio cruciais que afetem seu futuro. No FMI e no Banco Mundial, o principal mecanismo de controle é o tamanho das subscrições de capital dos países ricos, o que lhes dá enorme poder de voto em relação à massa de países em desenvolvimento. O Grupo dos Oito tem 48% do poder de voto, enquanto um grupo de oito países pobres, endividados que se encontraram numa conferência contrária à do G-8 em 1998 tinha apenas 1,6% dos votos. Muitas organizações da sociedade civil há longa data voltados para os oprimidos e empobrecidos têm chamado cada vez mais a atenção para os impactos negativos da globalização. Aqui no Fórum do Milênio, nós, da mesma forma, ressaltamos a necessidade de garantir a igualdade, manter a justiça e proteger a diversidade à medida em que enfrentamos os desafios da globalização. Ao revermos
as declarações recentes da sociedade civil, bem como as
contribuições do Fórum do Milênio, incluindo o artigo
produzido por nosso grupo de trabalho Os Desafios
da Globalização: Atingindo Igualdade, Justiça e
Diversidade, podemos afirmar a importância dos
seguintes princípios e idéias enquanto lidamos com o
processo de globalização.
Fortalecimento e Democratização das Nações Unidas Conforme afirmamos anteriormente, a ONU é hoje a instituição isolada mais importante do mundo. Em sua carta, ela busca dar voz às aspirações e esperanças de todos os povos do mundo. Foi, efetivamente, criada para ajudar a humanidade a realizar seu antigo sonho do estabelecimento da paz e da justiça universal. Sob muitas formas, podemos também afirmar que a ONU é a instituição que melhor reflete as maiores tendências de nossa época. Embora imperfeita, esforça-se em ser modelo de democracia. Através de suas diversas agências, tem buscado dividir e mesmo aumentar os novos tipos de conhecimento existentes no mundo - e, em alguns casos, através de mecanismos como o tratado de não-proliferação nuclear, busca controlar os efeitos danosos dessa expansão do conhecimento humano. E, finalmente, por sua mera existência como uma organização unitária voltada para os interesses de todas as nações e povos, é uma expressão concreta de nossa existência como uma única família humana. A ONU tornar-se-á apenas cada vez mais importante nos anos por vir - e sua efetividade e força dependerão em grande parte do grau com que formar novas parcerias no mundo. Tais parcerias devem incluir conexões fortes não somente com os estados membros, mas também com corporações de negócios, que se tornaram atores tão importantes no cenário mundial de hoje. Por último mas não menos importante, a ONU deve aprofundar e fortalecer as parcerias que estabeleceu com a sociedade civil global. A ONU aumentará sua importância porque as questões aqui discutidas, que cremos serem as preocupações mais sérias de nosso tempo, devem ser em última instância abordadas em nível global e resolvidas através de coordenação global. Paz e segurança são assuntos que sempre podem ser melhor abordados através de um fórum internacional com autoridade para mediação, arbitragem e, se necessário, resolução vigorosa. Embora a pobreza deva ser tratada em nível local e nacional, as forças globais que, com freqüência demais, algemam nações inteiras, devem se voltar em nível global para a criação de leis e mecanismos para regular essas forças. Direitos humanos, especialmente quando são violados por um governo, só podem freqüentemente ser tratados de fora das fronteiras nacionais; conseqüentemente, o estabelecimento e manutenção de normas internacionais é fundamental. Desenvolvimento sustentável, que deve ser baseado em ação local, deve ainda assim ser abordado globalmente e nacionalmente, dado o grau em que nosso ambiente global se encontra interconectado. Outros desafios da globalização, também requerem exame e correção por parte de uma agência global. Em lugar de tirar o controle das comunidades locais, uma ONU forte e democrática proverá, de fato, uma rede de trabalho na qual essas comunidades serão capazes de ganhar controle sobre a maior parte dos aspectos de suas vidas. Para esse fim, o sistema global que divisamos operará segundo o princípio de subsidiariedade. Subsidiariedade - i. e., criar políticas, tomar decisões, implementar programas e estabelecer regulamentos no nível em que é mais apropriado, seja local, nacional, regional ou internacional - facilitará grandemente tanto o uso ideal dos recursos disponíveis como a participação do povo e das comunidades mais imediatamente afetadas. Os benefícios desse princípio não podem ser completamente atingidos sem uma ampla rede mundial de trabalho na qual se possam analisar questões, estabelecer e fortalecer políticas justas, e coordenar programas. Uma ONU democrática fornecerá tal rede. Nos últimos
anos, a sociedade civil tem liderado o pensamento sobre
como se pode fortalecer e democratizar a ONU. Seguindo
essa linha, insistimos por uma consideração cuidadosa
das propostas defendidas pelo grupo de trabalho
Fortalecendo e Democratizando a ONU e Outras
Organizações Internacionais do Fórum do
Milênio, que, junto com outros documentos das ONG
contém os seguintes princípios e propostas.
O Que Deve Ser Feito? Buscando ir além de meramente fazer exigências, o Fórum do Milênio deseja lançar uma série de passos concretos que possam ser dados para transformar a visão acima mencionada de um mundo pacífico, justo e próspero em realidade mais rapidamente. Em particular, queremos afirmar que há passos que todos os atores nos níveis internacional, nacional, regional e local podem dar. Não pretendemos contar apenas com a ONU e os governos para achar soluções. Por essa razão, nosso programa de ações se divide em três categorias: passos que podem e devem ser dados pelos governos; aqueles que podem e devem ser dados pela ONU e suas agências; e aqueles a serem dados por organizações e indivíduos preocupados da sociedade civil em todo mundo. Como tema dominante a esse respeito, queremos reforçar a necessidade de parceria em todos os níveis. Essa palavra, parceria, tem-se tornado bastante proeminente na ONU e em encontros da sociedade civil recentemente, mas pretendemos aprofundar o entendimento compartilhado de seu significado e potencial. À luz da interdependência mundial, afirmamos vigorosamente que nenhuma autoridade ou agente isolado pode cumprir a agenda acima sem consulta real e colaboração ativa com os outros. Todos devem se envolver: a ONU e outras agências internacionais; os governos; e a sociedade civil em todas as suas manifestações, incluindo ONGs, grupos de jovens, uniões de comércio, autoridades regionais e locais, negócios e corporações públicas e privadas. Desejamos chamar atenção particular ao Relatório do Secretário Geral à Conferência de Cúpula do Milênio, Nós os Povos: O Papel das Nações Unidas no Século XXI, que defende uma visão de inclusão global similar àquela que oferecemos aqui e estabelece uma base firme para a parceria entre todos os envolvidos na solução dos desafios globais. Em particular, nós aplaudimos a visão do Secretário-Geral de interdependência global[37] uma nova ética de economia global;[38] normas globais... preocupações e ação globais... normas globais;[39] novas formas de governança global;[40] um futuro compartilhado, baseado em nossa humanidade comum em toda sua diversidade; [41] e uma civilização global emergente dentro da qual haverá lugar para que toda a rica diversidade do mundo se expresse totalmente.[42] O Relatório do Secretário-geral também oferece numerosas propostas concretas que são ousadas e realistas, muitas das quais totalmente endossadas por nós. Devemos adicionar, entrementes, que algumas de suas propostas não vão longe o suficiente, e desejamos, por isso, propor uma ação ainda mais audaciosa. Nos documentos preparados pelos grupos de trabalho em cada um dos subtemas do Fórum do Milênio, nós formulamos propostas detalhadas sobre o que cada um dos maiores envolvidos pode fazer, e dirigimos a atenção de todos para essas propostas. Devemos ainda chamar atenção novamente para os documentos-chave da sociedade civil como a Agenda de Hague para a Paz e a Segurança no Século XXI, e a Carta da Terra, às quais já nos referimos. No interesse de chamar atenção àqueles passos que sentimos serem os mais críticos, entretanto, queremos listar alguns dos passos para ação que podem ser dados pelos maiores atores da cena internacional de hoje. Todos esses passos, sentimos, são inteiramente possíveis e práticos. Quaisquer realidades políticas, como quer que sejam, que possam estar no caminho, acreditamos serem remanescentes de um velho pensamento, velhos caminhos, e velhas instituições. O Que os Governos Devem Fazer Nosso foco
é uma ONU mais forte, tendo em vista que ela encarna as
melhores possibilidades de ação coordenada para
promover justiça, paz, desenvolvimento sustentável,
direitos humanos e uma resposta coordenada aos desafios
impostos pela globalização. Uma vez que são os
governos que compõem as Nações Unidas o peso da ação
recai em grande parte sobre eles. A esse respeito,
pedimos aos governos que:
O que a ONU deve fazer Apesar de
que a maior carga para a mudança no sistema
internacional recaia sobre os estados membros das
Nações Unidas, que devem agir apropriadamente para
corrigir a Carta da ONU ou para passar novas resoluções
e legislação na Assembléia Geral, as várias agências
da ONU, incluindo o Banco Mundial e o FMI, bem como o
secretariado da ONU, têm diante de si várias formas
criativas para enfrentar os desafios por vir. Muitos
desses caminhos foram expostos na proposta do
Secretário-Geral à Conferência de Cúpula do Milênio,
como discutido anteriormente. Além desses pontos,
entretanto, nós insistimos nas seguintes ações.
O que deve fazer a sociedade civil A sociedade civil não deve esperar pelos governos ou meramente pressioná-los a agir. No mundo de redução da pobreza e desenvolvimento, as ONGs já estão agindo por si mesmas. A Agenda de Hague descreveu uma série de ações independentes que podem ser executadas pelas ONGs. E a ação dessas organizações nos campos dos direitos humanos e desenvolvimento são bem conhecidas. Entretanto, agora é hora de toda a sociedade civil do mundo esforçar-se para trabalhar unida nas questões de interesse comum através do desenvolvimento de novas redes de trabalho, coalizões e associações para ação. Mais
especificamente, a sociedade civil deve tomar as
seguintes atitudes:
Em conclusão Nós, representantes da sociedade civil de todo o planeta, nos reunimos aqui no Fórum do Milênio. Nós apoiamos as Nações Unidas - a instituição isolada mais importante do planeta - e prometemos ajudá-la a tornar-se mais democrática e efetiva. Nos endossamos o espírito e as metas da Agenda de Hague pela Paz e Justiça para o Século XXI, O Resumo do Programa de Ação de Seul: Uma Agenda pela Paz, Segurança e Desenvolvimento no Século XXI; A Mensagem de Montreal: O Espírito de Montreal; e a Carta da Terra. Nós
expusemos aquilo que cremos ser as maiores questões
diante da comunidade mundial e apresentamos propostas
específicas que, se postas em prática, criarão uma ONU
mais democrática e vibrante para o século XXI. As
Nações Unidas, os governos e a sociedade civil têm
todos papéis críticos a desempenhar para ajudar a
ONU a desenvolver seu grande potencial. O futuro que divisamos e que nos comprometemos a buscar é o de uma civilização mundial justa, pacífica e sustentável. Tal civilização será caracterizada pela democracia, o domínio da lei, direitos humanos, inclusão, compaixão e amor. Considerará o desenvolvimento um processo em que o progresso material não seja um fim por si só, mas um veiculo para o avanço cultural e espiritual. Essa civilização estimulará o crescimento físico, emocional intelectual e moral do indivíduo. As crianças serão amadas como nosso recurso mais precioso e serão vistas como a esperança de todos. As famílias serão protegidas e educadas. As mulheres terão os mesmos direitos dos homens e estarão na linha de frente em todos os campos do empreendimento humano. A violência em todas formas - inclusive contra mulheres e crianças, guerras, pobreza, racismo e exclusão social - desaparecerá, e o serviço aos outros e à comunidade como um todo será um princípio que guiará a ação individual e coletiva. Nessa
civilização, a educação será universal e por toda a
vida, e criará um senso de cidadania mundial. Todos os
povos participarão na criação e aplicação do
conhecimento, e os frutos da ciência e tecnologia
beneficiarão toda a família humana. Os sistema
econômicos suprirão as necessidades dos povos e
comunidades, e haverá trabalho para todos. A criação e
o desfrute de beleza será central no ritmo da vida
comunitária. Um padrão de vida sustentável será
estabelecido no qual viveremos com moderação, justiça
e humildade, dessa forma não somente preservando o
ambiente, com também protegendo os direitos das
gerações futuras. Sistemas de governo democráticos em
todos os níveis da sociedade - do local ao global -
permitirão que as pessoas assumam responsabilidade sobre
os processos e instituições que afetem suas vidas.
Estamos firmemente convencidos de que essa visão é nosso futuro comum. Nós apelamos às Nações Unidas, e aos líderes reunidos na Conferência de Cúpula do Milênio, que aproveitem essa oportunidade de transformar a ONU numa instituição capaz de agir conforme essa visão e ajudar a guiar a humanidade em seu futuro prometido. |